Especial para o Jornal da Manhã, Ijuí, RS.
Berlim comemora 20
anos da queda do muro
Turista chinesa no famoso Checkpoint Charlie, que hoje é ponto de visitação obrigatório para quem está de passagem por Berlim |
A Alemanha e o Mundo celebraram 20 anos da queda do muro de Berlim no Portão de Brandenburgo na segunda-feira em Berlim. Apesar da chuva, cerca de cem mil berlinenses e turistas estiveram presentes na festividade. Mais de 30 antigos e atuais chefes de estado e personalidades do mundo inteiro estiveram presentes. Entre eles os presidentes da Rússia Dimitri Medwedow e da Franca Nicolas Sarkozy, o primeiro ministro britânico Gordon Brown, a secretária de estado dos Estados Unidos Hillary Clinton e o último líder da ex União Soviética Michail Gorbatschow. A chanceler alemã Ângela Merkel, que foi cidadã da Alemanha Oriental, disse que a queda do muro foi um dos momentos mais felizes da história da alemã e européia e "um dos momentos mais felizes da minha vida". Ela falou do início de uma nova época com o fim da Guerra Fria e disse ainda que a liberdade não surge por si mesma "a liberdade deve ser conquistada". O prefeito de Berlim, Klaus Wowereit, fez um apelo: derrubar agora os muros no mundo inteiro "os muros de pedra e os muros
dentro das cabeças". Tanto Merkel como Wowereit lembraram em seus discursos que o dia 9 de novembro também marca o início do capítulo mais triste da história alemã: a Noite dos Cristais, em 1938, o "ensaio geral" do holocausto que viria nos anos seguintes. Os nazistas coordenaram uma ação em massa contra os estabelecimentos pertencentes aos judeus, incendiaram sinagogas, centenas de pessoas foram mortas e milhares foram enviadas para campos de concentração.
Um dos pontos culminantes da celebração foi a queda simbólica do muro: 1000 peças de dominó superdimensionadas foram posicionadas em fila no decorrer de cerca 1,5 Km entre o Portão de Brandenburgo e Potzdamer Platz no exato lugar onde antes passava o muro. As peças foram pintadas tematizando a história do muro por crianças, estudantes e artistas de todo o mundo. O empurrão no primeiro dominó foi dado pelo ex-sindicalista e presidente da Polônia Lech Walesa junto com o ex-presidente da Hungria Miklos Nemeth.
Beijo entre os líderes comunistas Leonid Brejnev e Eric Honecker |
O jornal Die Zeit fez uma reportagem com personalidades da política e das artes que viveram na Alemanha do Leste onde se podem ler críticas a respeito de um certo silêncio no que concerne a essa página da história alemã. Conforme a reportagem, até hoje a maioria das pessoas da Alemanha Ocidental não tem idéia de como a queda do muro colocou de ponta cabeça a biografia dos excidadãos no Leste. Trata-se de um fenômeno da reunificacao alemã, também 20 anos depois, o fato de pessoas da Alemanha Ocidental não tenham um sentimento sobre o que significou para as pessoas do Leste perder seu cotidiano. A República Federal da Alemanha celebrou em 2009 bem naturalmente e altamente oficial os seus 60 anos, como se 1989 não tivesse existido.
"Não seria o caso de se celebrar 40 anos da República Federal da Alemanha e os 20 anos da Nova Alemanha?" questiona Die Zeit. Uma das entrevistadas, a atriz alemã C. H., diz que responde com silêncio às perguntas que são praticamente acusações tais como "como o socialismo feriu moralmente as pessoas?". Ela responde: o que poderíamos contar ainda se os ocidentais já sabem tudo mesmo e não querem saber mais nada". A atriz conta que se sentia livre quando vivia na RDA. Depois da queda do muro, ela diz ter tido problemas porque o palco agora se parecia mais a sua cozinha, não mais os grandes temas, senão o privado, o pequeno. A chanceler alemã Ângela Merkel, ex-cidadã da RDA disse certa vez que "surgiu uma falsa impressão de que a vida na RDA e o Estado na RDA foram igualmente graves. Nós celebrávamos Natal, Páscoa e Pentecostes e tínhamos discussões e problemas familiares e alegria e diversão. Todos no oeste pensam que os do leste devem exaltar, celebrar a reunificacao alemã porque a vida deles foi tão terrível. Falta no oeste muitas vezes a curiosidade de intercambiar experiências positivas". Em algum momento a Sra. Merkel parou de fazer esse tipo de comentários, diz Die Zeit.
Ex - Alemanha Oriental hoje:
Trabalho: índice de desemprego é 12 %, o dobro que no Oeste. Política: 42% estão insatisfeito com a democracia e 11% muito insatisfeitos. Apenas 0,4% dos entrevistados acreditam nos políticos. Leste-Oeste: 63% dos alemães do Leste acreditam que as diferenças entre Leste e Oeste são maiores que os fatores em comum. Oeste-Leste: 50% dos alemães ocidentais nunca estiveramno Leste.
Atraso tecnológico foi empecilho (texto Janis Loureiro)
Com a queda do muro e o fim do regime, o retorno da Alemanha Oriental à democracia foi doloroso. O país estava empobrecido e para os cidadãos do Leste a vida mudou de um dia para o outro. As pessoas tiveram que se adaptar a um novo sistema de leis, um novo sistema escolar, uma nova liberdade para viajar a outros países, uma nova vida de desempregado, novos preços de aluguéis, novos carros. Tudo isso penetrou fundo na vida dos cidadãos do leste enquanto os do oeste simplesmente seguiram o curso normal de suas vidas. Rudi Brust testemunhou logo após a queda do muro as diferenças entre as Alemanhas. "Eles estavam 50 anos atrasados em tecnologia", conta. Brust relata que os prédios e estruturas estavam sucateadas e a expectativa na época de recontrução em cinco
anos não se confirmou. "Os cidadãos orientais não tinhamliberdade, mas tinham emprego e comida", conta. "Por isso, muitos não conseguiram se adaptar, devido ao atraso cultural tanto que hoje dizem preferir o velho regime", avalia.
Crônica:
Pedalar é pensar na velocidade ideal!
Se não fosse pelo clima e algum outro detalhe, Berlim seria uma cidade quase perfeita. Poucos seres humanos, ruas espaçosas e arborizadas, parques imensos, lagos despoluídos, riqueza cultural, aluguéis baratos e ciclovias.
Apesar do gelo, da ausência quase completa de sol durante o ano inteiro, do mau tempo e do mau humor generalizados, uma boa parte da população não se intimida e usa a bicicleta como meio de transporte durante as quatro estações. Se pode adquirir bicicletas – muitas vezes de origem duvidosa - no mercado de pulgas por até 30 euros. É sempre muito fácil acostumar-se ao que é bom e barato. E a bicicleta traz, além disso, vantagens de ordem política, econômica, ambiental, visual, auditiva, corporal e filosófica.
Se a população mundial num fenômeno de lucidez coletiva resolvesse boicotar o uso de automóveis e passasse a usar apenas o transporte público e a bicicleta, boa parte dos problemas do mundo já estariam solucionados. As emissões de gás carbônico diminuiriam, os Estados Unidos teriam uma razão a menos para invadir o Oriente Médio, a classe média viveria melhor pagando menos hipotecas, chegaríamos mais rápido ao trabalho, respiraríamos mais aliviados e morreríamos menos de infarto.
No âmbito da economia pessoal a bicicleta quita os custos com gasolina ou transporte público. O que também pode significar trabalhar um pouco menos para viver melhor. Trabalhar menos significa colaborar por um mundo menos produtivo e, em conseqüência, menos autodestrutivo.
Mesmo com o pânico clima change a mídia e os governantes do mundo inteiro, impregnados pela fé deslumbrada na sociedade hiper capitalista, continuam a omitir o mais evidente: não haverá diminuição nos níveis de contaminação de gás carbônico sem a diminuição dos níveis de consumo da população dos chamados países desenvolvidos e também subdesenvolvidos.
Há uma mirada míope sobre o conceito de qualidade de vida que passou a ser basicamente sinônimo de poder de consumo. Há um silêncio constrangedor no que diz respeito a diminuir os níveis de consumo. Consumir com prudência produtos tão simples como comida, roupa, papel, automóveis, gasolina, produtos eletrônicos, energia, água... Como vovó já dizia...
Desenvolvimento também é saber olhar para trás, para baixo, à esquerda e à direita e não apenas para frente, para cima e para o próprio umbigo. Antes da bicicleta já existia o cavalo e a água na torneira continua sendo um milagre para milhões de pessoas no mundo. Vivemos na Idade em que os pobres são obesos e os ricos sofrem de anorexia. Onde possuir um automóvel moderno é sinônimo de poder. Um mundo onde se vive para trabalhar e não ao contrário certamente sofre de alguma esquizofrenia.
O que poucos sabem é que entre esperar o ônibus e o trem entupido de almas estressadas ou enfrentar o trânsito engarrafado, tornou-se mais rápido mover-se com a bicicleta. Além de ser grátis, é um exercício sem custos adicionais para o corpo e um descanso para a mente. É como caminhar, apenas dez vezes mais rápido. É como meditar sem pagar curso de yoga. Saindo do trabalho você esquece o chefe e os problemas, monta na magrela e voa como o vento pelas ruas. Ultrapassando engarrafamentos quilométricos com um justo sorriso de vitória nos lábios, o pensamento voa com um cavalo selvagem em campos sem dono. Só não esqueça de usar a luz traseira. E cuidado com os japoneses malucos no trânsito.